sexta-feira, agosto 10, 2007

Economia do fósforo

Autor da imagem: Tim Newbery

Hoje em dia, quando tanto se fala do impacte da actividade humana sobre o aquecimento global e da importância que tem, para o mundo, a economia do carbono - este com cotações interessantes no mercado internacional - pareceria que Portugal poderia contribuir de uma forma pioneira, para o controlo dessas duas contingências mundiais e, porque não dizê-lo, até com um rasgo inovador, poupando não só o carbono, mas também o fósforo reduzindo, em simultâneo, o desperdício do tempo e da paciência dos residentes da nação.
Refiro-me aqui à economia daquele fósforo inserido na matriz orgânica dos alimentos humanos que, de acordo com os entendidos, contribui para o bom desempenho da nossa massa cinzenta, o que, como sabemos, não é já em si mesma, lá essas coisas, merecendo portanto o seu dispêndio em vão, ser devidamente controlado.
Bem pensado, não acham?
Muito obrigada!
Os meus caros e raros leitores não fazem a mais pequena ideia do que lhes estou a falar?
Ora, é claro que os meus caros e raros leitores sabem muito bem o que estou a tentar dizer, mas, mesmo assim, vou explicar este meu brilhante e criativo raciocínio para todos os outros que não me lêem, aduzindo um exemplo, devidamente, "orientado" por um objectivo, como demonstrarei:

EXEMPLO:
Andaram os nossos políticos de todos os quadrantes, juristas, legalistas, constitucionalistas, CRUP, CCISP, reitores de universidades, presidentes de politécnicos e até cidadãos comuns a dar voltas ao miolo e tratos de polé, às sucessivas e múltiplas redacções do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, para que o texto legal final da Lei, actualmente, em promulgação, escarrapachasse bem a diferenciação dos subsistemas de ensino superior - universidades para um lado e politécnicos para outro.
Claro que, depois de muito se falar dentro e fora das instituições, cada um interpreta a investigação destinada aos Politécnicos, com a designação "orientada" - expressa no artigo 7º, ponto 1, do Texto Final Da Proposta De Lei N.º 148/X-Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior ( aqui ) - conforme melhor lhe parece e, sobretudo, dá jeito, eu também tenho a minha interpretação, mas para o que lhes gostaria de transmitir, não nos interessa.
Já experimentaram indagar as diferentes interpretações?
Não?
Então experimentem e digam-me os resultados a que chegaram. (Sugestão para não se maçarem: perguntem a opinião a um ou dois quaisquer presidentes e reitores)

Mais interessante ainda, irá ser depois, na hora do "vamos ver" quando todos acharem que se podem candidatar a todos os financiamentos públicos (outras formas de financiamento não interessam) e os outros mais de 50%, também interessados, no mesmo bolo de financiamento, acharem que as propostas oriundas dos politécnicos ou a) não estão devidamente "orientadas", como especifica a lei, e por isso não merecem ser consideradas para candidatura a nenhum financiamento ou b) a proposta da escola X, como é submetida por alguém politicamente maleável, até merece uns migalhos, e pague-se lá 10% do que diz e demonstra que precisa, para não torrar as ideias...

Aqui valem apostas! Eu pago 100 por cada 1.
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Entretanto, atentem, por favor, ao seguinte facto:
O GPEARI - Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais do MCTES (antigo OCES, lembram-se?) até se deu ao trabalho de publicar um Glossário, pertinente às definições e conceitos relevantes para áreas de actividade do OCES, que inclui na letra I- CLASSIFICAÇÃO Investigação e Desenvolvimento (I&D) , assim:

CLASSIFICAÇÃO Investigação e Desenvolvimento (I&D)Todo o trabalho criativo prosseguido de forma sistemática, com vista a ampliar o conjunto dos conhecimentos, incluindo o conhecimento do Homem, da Cultura e da Sociedade, bem como a utilização desse conjunto de conhecimentos em novas aplicações.
Do ponto de vista funcional distinguem-se as seguintes categorias de actividades de I&D:
INVESTIGAÇÃO FUNDAMENTAL (IF) - Categoria de actividade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) que consiste em trabalhos, experimentais ou teóricos, empreendidos com a finalidade de obtenção de novos conhecimentos científicos sobre os fundamentos de fenómenos e factos observáveis, sem objectivo específico de aplicação prática.

INVESTIGAÇÃO APLICADA (IA) - Categoria de actividade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) que consiste em trabalhos originais efectuados com vista à aquisição de novos conhecimentos com uma finalidade ou objectivo pré-determinados.

INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (I&D) - Categoria de actividade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) que consiste na utilização sistemática de conhecimentos existentes, obtidos por investigação e/ou experiência prática, com vista à fabricação de novos materiais, produtos ou dispositivos, estabelecimento de novos processos, sistemas ou serviços, ou para a melhoria significativa dos já existentes.
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Agora, por favor, expliquem-me lá porque será que o Senhor Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior decidiu então, da própria lavra, usar o conceito de "Investigação orientada" em oposição a nenhuma(s) outra(s) classe(s) de investigação, e com interpretações aleatórias, se não for apenas para efeitos de consumo desnecessário de neurónios ou para incrementar mais ainda a confusão que está a conseguir instalar.

Não acham que o Senhor Ministro poderia/deveria, simplesmente, utilizar a classificação adoptada no seu próprio ministério e dizer, textualmente, na sua proposta de lei que a investigação fundamental com potencial financiamento público, seria da competência e dever exclusivos das universidades, tal como as formações, ao nível de doutoramento. Como o Senhor Ministro não fez o que devia, podem crer-me, este mesmo tema, no futuro, fará correr muita tinta e será o pezinho de muitas danças de bastidores.

4 Comentários:

Blogger Alexandre Sousa disse...

FRASCATI MANUAL:
A definição básica de I&D presente na edição actual do FM é:
“Research and experimental development (R&D) comprise creative work undertaken on a systematic basis in order to increase the stock of knowledge, including knowledge of man, culture and society, and the use of this stock of knowledge to devise new applications." (OECD, 2002, Pg. 63)

O manual define três camadas de actividade para o I&D, cada uma com horizontes diferidos no tempo no que se refere à sua exploração potencial:
- investigação básica,
- investigação aplicada
- desenvolvimento experimental.
Além disso a investigação básica está subdividida em investigação básica pura e investigação básica orientada.

"Basic research is experimental or theoretical work undertaken primarily to acquire new knowledge of the underlying foundations of phenomena and observable facts, without any particular application or use in view." (OECD, 2002, Par. 240)
"Oriented basic research may be distinguished from pure basic research as follows: Pure basic research is carried out for the advancement of knowledge, without seeking long-term economic or social benefits or making any effort to apply the results to practical problems or to transfer the results to sectors responsible for their application. Oriented basic research is carried out with the expectation that it will produce a broad base of knowledge likely to form the basis of the solution to recognised or expected, current or future problems or possibilities." (OECD, 2002, Par. 243)

Paramos aqui, para pensar… Só existem referências à «investigação orientada» quando o tema é investigação básica! Como diria o Rei da Prússia: Não sei se me estou a fazer entender.

"Applied research is also original investigation undertaken in order to acquire new knowledge. It is, however, directed primarily towards a specific practical aim or objective." (OECD, 2002, Par. 245)
"Experimental development is systematic work, drawing on knowledge gained from research and practical experience, that is directed to producing new materials, products and devices; to installing new processes, systems and services; or to improving substantially those already produced or installed." (OECD, 2002, Par. 249)

sexta ago. 10, 10:15:00 da tarde 2007  
Blogger Regina Nabais disse...

Obrigada Alexandre. Vou dar destaque ao seu comentário, num post.

sábado ago. 11, 12:57:00 da tarde 2007  
Blogger Alexandre Sousa disse...

Esta questão que RN agita já há algum tempo é espantosamente fulcral porque mostra a falta de rigor de um trabalho cuja premissa é dar esqueleto, fronteira, enquadramento a toda a estrutura da educação dita superior.
Não admito, que arbitrariamente, se assalte um manual de referência da actividade denominada Investigação & Desenvolvimento, publicado pela entidade supra referenciada pelo MCTES, a insuspeita (?!) OCDE e se corte à laia de lápis azul a palavra: «básica» de um enunciado onde está expressa «investigação básica orientada».
É que essa, por definição e tradição, é o grande território da investigação universitária por excelência.
Depois temos um terrorismo de ignorância quando por meio de uma Lei escrita nos costados de uma burra, se decreta por omissão, que as escolas politécnicas não podem fazer «investigação aplicada» e «desenvolvimento experimental». Era só o que faltava!

sábado ago. 11, 03:38:00 da tarde 2007  
Blogger Regina Nabais disse...

Alexandre, como lhe disse, a sua intervenção neste post, será imediatamente (AGORA) transferida para um post.
Não o fiz já, porque hoje tive uma escala de serviço de faxina mais absorvente. As minhas desculpas pelo atraso. Até já.

sábado ago. 11, 07:47:00 da tarde 2007  

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